1 -
Para começar, fale um pouco de si. Onde e quando nasceu? O que faz
profissionalmente?
Chamo-me Sérgio
Madeira de Sousa, sou casado e tenho um filho, nasci em 1967 numa pequena
aldeia do concelho de Aljustrel, chamada Jungeiros. Vivi nesta pequena aldeia
do baixo Alentejo até aos 19 anos, altura em que fui viver para o Barreiro até
cumprir serviço militar obrigatório aos 21 anos. Cumpri “tropa” na Marinha,
onde optei por ficar até hoje com 40 anos e onde pretendo terminar a minha vida
activa daqui a muitos longos anos, obviamente.
2 -
Quando é que teve início esta paixão pela Banda Desenhada, em especial pelo
Tex?
A paixão pela BD começou muito cedo, muito antes de aprender a ler. Quando
tinha seis ou sete anos, já tinha contacto com as revistas graças a um tio meu,
que tinha como passatempo ler banda desenhada. Provavelmente herdei dele o
gosto pela 9ª arte. Assim que aprendi a ler, lia todas as revistas que
apanhava, de todos os gêneros não era nada selectivo e o engraçado é que
sempre fui muito cuidadoso com as revistas, cuidadoso demais para quem tinha
tão tenra idade. Já nesta idade apresentava indícios de coleccionador sem
dúvida. O primeiro contacto com Tex foi mais tarde; já adolescente com doze ou
treze anos.
Passo a descreve-lo como o fiz na peça intitulada: "O principio" … Um dia, pego num lote de revistas e empresto a um rapaz três ou quatro anos mais velho do que eu, ele mostra-me as revistas que possuía para escolher e lá estava: Aquela revista destacava-se; Não enquadrava em nenhum dos formatos que eu conhecia, pouco maior que o formato do Falcão e muito
menor que o formato do Mundo de Aventuras e com muito mais páginas. Chamou-me imediatamente à atenção, cheio de curiosidade folheei avidamente a revista ignorando
completamente as restantes, fiquei fascinado com
os desenhos, muito fotográficos mas com uma enorme sensação de movimento, quase
cinematográficos, é assim que defino os desenhos do mestre Ticci, para mim,
o ainda melhor desenhador de Tex, apesar de já estar em declínio. Li
e reli a revista com enorme prazer, apreciando cada prancha e também o
argumento de G.L. Bonelli, argumento fantástico, cheio de acção e movimento,
ainda hoje umas das histórias que mais aprecio, não sei se pela qualidade, se
por ter sido a primeira. É verdade que esta primeira leitura influenciou o meu
gosto, naquelas que eu considero as melhores histórias está quase sempre o
traço de Ticci, …A história chamava-se: “Assalto
ao trem”, o nº 71 da 1ª edição. A partir deste dia cresceu uma
enorme vontade de mais e mais, esta sensação é semelhante à fome, uma vez
satisfeita apenas acalma temporariamente, pois volta sempre…
Passo a descreve-lo como o fiz na peça intitulada: "O principio" … Um dia, pego num lote de revistas e empresto a um rapaz três ou quatro anos mais velho do que eu, ele mostra-me as revistas que possuía para escolher e lá estava: Aquela revista destacava-se; Não enquadrava em nenhum dos formatos que eu conhecia, pouco maior que o formato do Falcão e muito
menor que o formato do Mundo de Aventuras e com muito mais páginas. Chamou-me imediatamente à atenção, cheio de curiosidade folheei avidamente a revista ignorando
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Vinheta de: Tex, assalto ao trem |
Foi
assim o meu primeiro contacto com Tex: inesquecível!
3 -
Porquê o Tex e não outra personagem?
R: Esta é uma
pergunta que tenho muita dificuldade em responder. Gosto muito de Banda
desenhada e durante parte da minha vida comprei vários tipos de revistas: Super
heróis, disney, western, enfim, vários géneros e inúmeros personagens. Mas
quando tive de reduzir devido aos custos, apenas sobrou Tex. Porquê? Talvez a
qualidade e o tamanho das histórias. Tex era a única revista em Portugal que
apresentava histórias muito complexas, as outras revistas tinham no máximo 64
páginas e por vezes apresentavam mais do que uma história. Na altura Zagor e
Mister No não eram distribuídos em Portugal, talvez essa tenha sido outra das
razões porque optei por Tex. Desconhecimento de outros personagens Bonelli.
4 - O
que Tex representa para si?
Tex
faz parte de mim. Como todos nós sabemos, somos o acumulado de experiências
vividas ao longo da nossa vida. Tex teve uma grande influência sobre mim, numa fase
muito importante na vida de qualquer pessoa: A adolescência! Quando estamos a
crescer somos altamente influenciados pelo que nos rodeia e nesta fase da minha
vida, passei muitas horas a ler BD, especialmente Tex. Assim, considero que o
personagem muito contribuiu para a minha formação como pessoa, os meus valores,
a minha forma de estar e de reagir perante as situações. Tex é também uma
agradável forma de entretimento e cultura, que me propicia horas de prazer. È
um passatempo óptimo para combater o stress do dia a dia, sem contra
indicações.
5 -
Qual o total de revistas de Tex que você tem na sua colecção? E qual a mais
importante para si?
Colecciono todas
as colecções que saíram no Brasil desde o Nº1. Reportando à numeração actual em
Portugal, possuo todas as colecções completas com excepção da 1ª e 2ª edições,
das quais me faltam cerca de 110 exemplares. Contabilizo assim cerca de 750
exemplares brasileiros, aos quais adiciono cerca de uma dúzia de exemplares
italianos. É difícil apontar a mais importante. Se a ideia é completar todas as
colecções, então todas as revistas são importantes, pois a falta de uma delas
impede o cumprimento do objectivo. Apesar do que referi
não posso deixar de salientar duas revistas:
Tex Nº 71 (1ªEd.), Assalto
ao trem. A história que me deu a conhecer este personagem e que desenvolveu a
paixão que me assola até hoje, passados cerca de 20 anos.
Tex Nº 100 (1ªEd.),
Aventura em Utah. A revista com que iniciei a minha já longa colecção.
A terceira revista
mais importante não posso indicá-la de momento, será aquela que me permitirá
afirmar que tenho todas as colecções completas.
6 -
Colecciona apenas livros ou tudo o que diga respeita à personagem?
A ideia como já
referi é completar todas as colecções que saíram no Brasil desde 1971.
Conseguir todas as revistas é quase uma obsessão, uma vez que várias colecções
são repetições, apesar disso faço questão de adquiri-las. Gostaria muito de conseguir
tudo o que diz respeito ao personagem, principalmente as edições italianas.
Como seria extremamente difícil e dispendioso consegui-lo, prefiro
concentrar-me num objectivo realista – conseguir todas as edições brasileiras,
do que dispersar os meus recursos e tentar adquirir tudo e não conseguir
completar nada. Além das revistas Tex, também colecciono tudo o que saiu no
Brasil de Zagor e Mister No. Não faço questão de adquirir outros objectos
relacionados com o personagem, no entanto, possuo os brindes que acompanham as
revistas como o porta-chaves ou a revista poster e gostaria muito de adquirir o
poster das 400 capas.
7 -
Qual a sua história favorita? E qual o desenhador de Tex que mais aprecia? E o
argumentista?
Existem inúmeras e
excelentes histórias na saga Texiana. Apesar desse facto considero que existe
uma história que supera todas as outras. A 3ª história desenhada por Ticci,
intitulada “A cruz trágica”, publicada no Brasil pela primeira vez nos números
50, 51 e 52 do Tex mensal. Esta história além de possuir um argumento muito bem
conseguido, muito movimentado e repleto de dificuldades para os nossos heróis,
apresenta um Ticci, que apesar de estar no inicio, consegue nesta história
desenhos assombrosos, desenhando como só ele sabe, as paisagens fantásticas das
florestas do Canadá. A existir a transposição do personagem para o cinema, sem
dúvida que esta seria uma das histórias que geraria mais consenso entre os fãs.
Posso indicar outras igualmente excelentes: A grande intriga (Tex 107 a 110) [1], Missão em Great
Falls (Tex 131 a 134) [1],
O solitário do Oeste (Tex 163 a 165) [1], A grande ameaça
(Tex 182, 183) [1]
e O assassino sem rosto (Tex 193 a 195) [1]. Aproveito para
colocar uma questão à Mythos: Com todas as histórias que têm sido republicadas,
como é que é possível que as 4 últimas histórias só tenham sido publicadas uma vez?
Será que estas histórias são de qualidade inferior às que foram publicadas em
Tex Ouro, Especial de férias ou no Almanaque?
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Prancha de Giovanni Ticci |
Como desenhadores preferidos não consigo
apontar apenas um. Gosto muito do trabalho do Ticci da 1ª e 2ª fase, penso que
ele tinha um traço limpo, bastante detalhado, e conseguia impregnar os seus
desenhos de uma sensação de movimento, que não está ao alcance de outros
desenhadores consagrados. Civitelli por exemplo: As vinhetas de Civitelli
parecem fotografias, falta-lhe no entanto essa sensação de movimento que leva
os desenhadores para um patamar superior. Actualmente o traço de Ticci está a
perder qualidade, no entanto ainda entra no meu top5, conjuntamente com: Galep,
Della Monica, Irmãos Cestaro e Repetto. Quanto ao Repetto: Confesso que fiquei
algo desiludido ao saber através da entrevista que concedeu ao Blog, que os
cenários que ambientam as suas vinhetas, não são de sua autoria, mas sim de um
assistente. Penso que os cenários são parte importante do trabalho de um
desenhador e deveria se dar o crédito a esse assistente, uma vez que o seu
trabalho é fantástico e muito contribui para a qualidade do trabalho apresentado
pelo Repetto. E se o assistente decide trabalhar sozinho? Será que não daria um
óptimo desenhador de Tex? È provável que à medida que
vou conhecendo o trabalho
dos novos desenhadores tenha de refazer o meu top5, pelo pouco que vi do
trabalho dos 15 novos desenhadores, alguns deles têm muito potencial. Recordo-me
especialmente de Marco Torricelli, de quem disse que tinha todas as qualidades
para se tornar um dos melhores desenhadores de Tex. Além destes existem outros
igualmente muito bons que deixei fora, como Nicolò ou Lettèri, os quais muito
contribuíram para o sucesso do personagem naquela que eu considero a melhor
fase, (1966 a 1983). Os argumentos a cargo de G.L. Bonelli e Guido Nolitta e desenhos
de Galep, Fusco, Ticci, Lettèri e Nicolò.
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Prancha de Miguel Angel Repetto |
Quanto a
argumentistas não tenho dúvidas: Guido Nolitta. Simplesmente insuperável.
Compro qualquer personagem que seja escrito por ele. Além do seu trabalho em
Tex também conheço em Zagor, Mister No e Estrela Negra. Só é pena que devido
aos seus afazeres editoriais não disponha de tempo para escrever, gostaria
muito de ler um Texone escrito por ele e desenhado por Ferri. Ao ler o
planeamento editorial da SBE para 2008, observei com satisfação que o Sérgio vai
escrever algumas das histórias do ano. Não é um Texone, mas não deixa de ser
uma excelente noticia.
8 - O
que lhe agrada mais em Tex? E o que lhe agrada menos?
Esta é outra
pergunta que tenho dificuldade em responder. O que me agrada no personagem é a
sua postura, a total disposição para ajudar amigos e necessitados e a
capacidade que possui para enfrentar as mais complexas situações. O que me
agrada mais na revista: Os argumentos longos e complexos. É quase como estar a
“ler” um filme. O que me agrada menos no personagem é ser pouco introspectivo.
Raramente acompanhamos os seus pensamentos, as suas preocupações ou deduções.
Quanto ao que me agrada menos na revista: O formato! Estou a referir-me à
edição brasileira. Preferia o formato italiano com capa cartonada.
9 - Em
sua opinião o que faz de Tex o ícone que é?
São vários os
factores que contribuíram para o sucesso do personagem ao longo de quase seis décadas.
- A qualidade dos
argumentos. Tex sempre teve bons argumentistas, G.L. Bonelli, Cláudio Nizzi,
Nolitta, Segura e Boselli. Todos eles excelentes contadores de histórias. Nos
últimos anos tenho sido bastante crítico em relação a Nizzi, mas se analisarmos
o seu trabalho, verificamos que é o escritor principal da série desde Julho de
1983, (Tex it. Nº273 Intriga diabólica). 25 Anos a carregar o “fardo” de
substituir o também chamado patriarca dos quadradinhos italianos, GL Bonelli.
Todos concordam que é necessário ser um grande escritor para consegui-lo. Apesar
de Bonelli continuar a escrever até 1991, a maior parte das histórias nesse
período, foram da autoria de Nizzi. Estes dois escritores são responsáveis por
cerca de 80% de todas as histórias do personagem e muito contribuíram para
manter a “fórmula” do sucesso, desde a criação do personagem até aos dias de
hoje.
- A inexistência de
limite de páginas por história. Este é um aspecto muito importante! Dar
liberdade ao escritor para escrever. A história desenrola-se consoante a
inspiração, sem obrigação da apresentar a conclusão na página x. Por questões
que desconheço, actualmente as histórias têm de ter 220 ou 330 páginas, excluindo
algumas excepções, restringe-se assim a capacidade criativa do escritor e
elimina-se um dos factores que em minha opinião fizeram de Tex, aquilo que é
hoje. Se as histórias têm de terminar nas últimas páginas das revistas, o que
concordo plenamente, então o nº de páginas das revistas é que têm de variar
para se adaptar ás histórias e não o contrário.
- O tratamento
preferencial dado pela família Bonelli ao longo das décadas, ao personagem. Tex
é a principal revista da SBE. Nolitta concede-lhe um tratamento muito especial.
As outras publicações da editora estão subordinadas a Tex, argumentistas e
desenhadores da casa prestam provas nas outras publicações antes de serem
admitidos no staff Texiano. Além de esta forma de admissão, ainda existe outro
processo de selecção: O Texone – Artistas de renome são convidados para fazerem
uma interpretação do Ranger e se forem aprovados, então sim, são convidados a
fazerem parte da equipa permanente. Quantos outros personagens têm estes
critérios de selecção?
10 - Para concluir, como vê o futuro do Ranger?
Prancha de Marco Torricelli |
A última
remodelação do staff Texiano efectuada pelo editor Sérgio Bonelli, que permitiu
a entrada de 15 novos desenhadores, alguns dos quais já viram os seus trabalhos
publicados e também um novo argumentista – Tito Faraci, visou preparar o futuro
de Tex, da editora, mas também, a curto médio prazo a saída de Nolitta.
Já o tinha escrito no
texto intitulado: "Ventos de mudança", e estou plenamente convicto, que o
principal objectivo da remodelação foi exactamente esse – preparar a editora e
a sua principal revista, para a próxima década sem a sua liderança.
Apesar das novas tecnologias, (Internet,
vídeo jogos e TV interactiva), constituírem formas de entretimento muito mais
atractivas para os jovens, não nos podemos esquecer que, ler e coleccionar BD,
ao contrário de há 20 anos atrás, é um passatempo para gerações mais velhas,
(para cima dos 30 anos). Assim, a curto/médio prazo, com a remodelação
efectuada, penso que estão garantidas as condições para manter o interesse dos
actuais leitores e cativar novos leitores, “arrastados”, não pelo personagem,
mas sim pelos novos artistas.
A médio/longo prazo, o futuro de Tex
é incerto, tal como é incerto o futuro da BD. Com o passar dos anos é
necessário que surjam novos leitores que substituam os actuais, é necessário
criar hábitos de leitura e o gosto pela banda desenhada como forma de
entretimento e cultura. Quer os pais, quer as escolas desempenharão um papel
muito importante para se conseguir estes objectivos.
Para sobreviver aos tempos difíceis
que se avizinham, as editoras terão de possuir capacidade de inovar e de adaptação
às novas realidades, criando produtos mais apelativos e explorando novos
mercados. Também neste aspecto me parece que a editora Bonelli continua a
preparar o futuro, uma vez que continuam a aumentar o Nº de países onde a
revista do Ranger é publicada, o último dos quais a Rússia, mercado com milhões
de habitantes e muitas dezenas de milhar de potenciais leitores.
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