Zagor, personagem da BD italiana conhecida como “fumetti”, criado por Sergio Bonelli (argumento) e Gallieno Ferri (desenho) em 1961, somente em 1978, dezassete anos depois foi publicado no Brasil. O percurso deste herói, neste país da América do Sul, e as dificuldades dos fãs em aceder às suas aventuras não tem sido fácil, conforme demonstrei em 2010, num texto intitulado de PROBLEMAS.
Contudo, passados doze anos desde PROBLEMAS, se olharmos para trás
facilmente percebemos que as adversidades sentidas, na época, começaram a ser
eliminadas após 2001, ano em que a editora Mythos decidiu continuar a publicação
do personagem.
Na verdade, a Mythos iniciou a publicação de Zagor no Brasil em
junho de 1999, lançando para as bancas o primeiro número da coleção ZAGOR (ZM),
com a história “O anjo da vingança” extraída da coleção italiana SPECIALE ZAGOR
Nº 9, no entanto, devido ao baixo volume de vendas, a série foi interrompida
logo após a saída do terceiro numero e ficou na “gaveta” até julho de 2001:
data em que a editora, felizmente, decidiu dar uma nova oportunidade ao
personagem, optando por continuar a coleção em detrimento de lançar uma nova, e
que inicia um ciclo, ininterrupto, de publicações até aos dias de hoje.
Em abril de 2004, ainda com muito material inédito no Brasil para publicar, a editora reitera a aposta no “Rei de Darkwood” e coloca uma nova coleção nas bancas: ZAGOR EXTRA (ZXM): nos primeiros números incluía apenas aventuras completas extraídas de ZAGOR ALMANACCO, mas a partir do oitavo numero começa a publicar aventuras extraídas do ZAGOR italiano, de uma fase anterior à que estava a ser publicada em ZM.
Por vários anos, com três coleções em simultâneo nas bancas a publicarem histórias inéditas do personagem, extraídas das diversas coleções italianas, os zagorianos, portugueses e brasileiros, só poderiam estar satisfeitos. Mas não completamente, faltava algo! Faltava uma coleção que publicasse por ordem cronológica as aventuras de Zagor! Havia também a questão do formato das publicações, que alguns colecionadores reclamavam do famigerado “formatinho”, exigindo o “bonelliano”, e também da fraca qualidade do papel utilizado, por vezes muito fino e escuro. Mas globalmente só poderiam estar satisfeitos.
Mas será que estava tudo bem com as publicações de Zagor?
A prova que não estava tudo bem foi dada em fevereiro 2012, numa entrevista concedida pelo próprio
Dorival Vitor Lopes (DVL), a Pedro Cleto, no blogue do Tex, em que confidenciou
que os personagens que menos vendiam eram Zagor, Mágico Vento e Júlia, e que se
considerava satisfeito por ter conseguido estabilizar as vendas.
Esta informação passou despercebida à maioria dos colecionadores,
até porque não houve implicações imediatas, com a editora a publicar, até
agosto de 2013, mais de trezentas edições de ZM, ZEM e ZXM, a que se juntaram mais
três edições de ZAGOR GIGANTE, três de AS AVENTURAS DE CHICO e quatro[1] edições especiais. Nesta
fase, as dificuldades que afetaram as editoras antecessoras e que levaram ao
cancelamento precoce das suas coleções pareciam não afetar a Mythos, mas um comunicado da editora, em oito de
agosto, sobre alterações de estrutura, preço e periodicidade de ZM, ZXM e
JÚLIA, justificadas por mudanças no sistema de distribuição, recolhimento e
pagamento das revistas, mostrou que a realidade poderia ser um pouco diferente.
Ainda assim, e por mais ano e meio, as coleções de Zagor
continuaram nas bancas, como habitualmente, e provavelmente a maioria dos
colecionadores já havia esquecido o comunicado da editora, quando, em março de
2015, a coleção ZXM é encerrada no Nº 123, com a inusitada
justificativa
que não existia material inédito para publicar.
Não conseguindo inverter a situação negativa, os
cancelamentos indesejados continuaram: em novembro de 2018 a Mythos cancelou ZM, no Nº 181, e dois anos
depois, o ZEM no Nº 71, encerrando um ciclo, o do “formatinho”. Mas nem tudo
foi negativo, apesar dos maus resultados das vendas, a editora continuava a
acreditar no sucesso de Zagor, e, antes de cancelar ZEM, em julho de 2020,
atende a uma exigência antiga dos zagorianos e coloca nas bancas o primeiro
numero de ZAGOR CLASSIC (ZC): coleção em formato italiano que publica as aventuras
de Zagor pela ordem cronológica de ZAGOR italiano.
Afinal as piores expetativas não se confirmaram e os zagorianos
não ficaram sem acesso às aventuras do “Herói de Darkwood”! Apenas um mês após
o cancelamento de ZEM, e de uma forma surpreendente considerando que uma das
principais razões para os cancelamentos tinha sido o fraco volume de vendas, a
editora lança uma nova coleção de Zagor: ZAGOR NOVA SÉRIE (ZNS). Com esta nova coleção,
e em apenas seis meses, a editora reformulou o seu catálogo de Zagor encerrando
o ciclo do “formatinho” e colocando no mercado duas propostas muito desejadas
pelos colecionadores: ZC, que publica as aventuras clássicas do personagem, e
ZNS, histórias mais atuais.
Das novas publicações destaca-se, claramente, ZNS que supera todas
as minhas expetativas! As edições apresentam-se em formato italiano, incluem
histórias completas e bastante atuais, e são dotadas de lombadas elegantes,
modernas e atraentes, e de capas, que não sendo cartonadas, são de boa
espessura e apresentam-se “limpas” de texto desnecessário. O papel utilizado é
de muito boa qualidade, de boa gramagem, muito branco, e a impressão é excelente.
Atrevo-me a dizer que esta é a coleção que os zagorianos reivindicavam, à
Mythos, desde que a editora publica o personagem, e que é, muito provavelmente,
a melhor coleção de “O Espírito da Machadinha” já publicada no Brasil, superando,
inclusive, as coleções da editora Record.
Mas então, se temos nas bancas, provavelmente, a melhor coleção de
Zagor jamais publicada no Brasil, a publicar histórias recentes, e uma segunda
coleção que publica, cronologicamente, de inicio, as aventuras do personagem,
qual é o problema?
Quanto a ZC, com mais de dois anos de existência, e com quinze
edições publicadas de cerca de cem páginas, apenas publicou as primeiras doze[2] edições do ZAGOR italiano.
A este ritmo a coleção levará mais de quatro anos até publicar a primeira
história inédita[3],
e pior, mais de sete ou oito anos até ultrapassar esta fase do personagem em que
as aventuras eram mais dedicadas à gama infantil/juvenil.
Ainda relativamente a ZC, confesso que não entendi a opção por
edições com cerca de cem páginas. Não está conforme a edição italiana que
inicialmente possuía 130 páginas, pelo que a partir quarto numero deixou de
existir correspondência entre as duas séries. Ao não cumprir o requisito de
seguir, religiosamente, a edição italiana, a edição como está deixa de fazer
sentido, pelo que, para ultrapassar rapidamente a fase infantil/juvenil, a
melhor solução seria a adotada para ZNS, ou o “OMNIBUS”, ou seja, publicar
apenas histórias completas em edições muito volumosas. Fica a sugestão.
Já se passaram duas décadas desde que a Mythos iniciou a publicação de Zagor no Brasil e apesar das dificuldades sentidas ao longo de todo o processo, das vendas reduzidas em determinadas épocas, dos cancelamentos sucessivos, a verdade é que nunca desistiu do personagem, mesmo em 2020, quando o mundo se encontrava no inicio de uma crise sem paralelo, a editora correu riscos e lançou as duas [4] atuais coleções.
É verdade que falta uma outra coleção para publicar as
histórias, ainda inéditas, das diversas coleções italianas, uma vez que ZC, e
ZNS, apenas publicam as histórias extraídas de ZAGOR italiano. Mas também é
verdade que a crise atual é gravíssima e pode prolongar-se por muitos meses, ou
mesmo anos, e que, apesar das dificuldades, a Mythos solucionou grande parte
dos problemas de colecionar Zagor no Brasil com as duas coleções atualmente nas
bancas: colecionar pela ordem cronológica -
algo que não era possível desde que a editora Record cancelou o ZAGOR
EXTRA (ZER) em 1991 - e acompanhar as aventuras recentes do personagem.
NOTAS FINAIS:
Eu próprio, que já questionei e critiquei por diversas vezes
opções editoriais da editora, principalmente em Tex (Recomeçar e O limite da tolerância ), mas também
em Zagor (Edições comemorativas e Ponto de rutura), e ainda no geral (Audácia editorial ou loucura
empresarial?),
atualmente, estou muito agradecido à Mythos pela coragem e ousadia de continuar
a publicar, em situações tão adversas, “O Espirito da Machadinha”. Espero que
tenham sucesso e, caso venham sentir dificuldades, que resistam aos
cancelamentos e que se lembrem de 1999: é preferível diminuir o numero de
edições por ano, ou “congelar”, do que cancelar! A pausa feita entre o terceiro
e quarto numero de ZM assim o comprova.
LEGENDA:
·
ZM - ZAGOR MYTHOS
·
ZEM - ZAGOR ESPECIAL MYTHOS
·
ZR - ZAGOR RECORD
·
ZXM - ZAGOR EXTRA MYTHOS
·
DVL - DORIVAL VITOR LOPES
· ZC - ZAGOR CLASSIC
· ZNS - ZAGOR NOVA SÉRIE
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