O
jovem Andy Wilson fere com gravidade o xerife Tom Kenyon ao tentar detê-lo por
homicídio. Tex Willer, que acompanhava o seu amigo xerife, também é
surpreendido e não consegue evitar a fuga do jovem procurado. No rancho duplo B,
situado nas proximidades de Springville, ninguém acredita na acusação de
homicídio! Todos conhecem o jovem por Andy Morton, e todos o consideram
honesto, trabalhador, amigo, e incapaz de magoar alguém. Após garantir que Tom
se encontra bem e recolher informações sobre a possível localização de Andy,
Tex parte na pista do foragido que tenta atravessar o deserto de Las Piedras e
chegar à fronteira do México pelo trilho dos esqueletos. Andy escolheu este caminho
inóspito, e por vezes mortal para os que o ousam atravessar, para se livrar dos
perseguidores. A tentativa, no entanto, revela-se infrutífera, pois é capturado
por Tex em pleno deserto e muito longe do almejado objetivo.
O
regresso a Springville é repleto de imprevistos e contratempos em que os dois,
captor e preso, são obrigados a lutar juntos para salvar as próprias vidas. O
tempo que passam juntos, o comportamento e as atitudes demonstradas pelo
foragido, em que por mais do que uma vez salva a vida de Tex quando poderia
tê-lo matado, livrando-se dessa forma do julgamento que o espera, e da
sentença, que em ultimo caso poderia ser a forca, leva o ranger a pensar que o
jovem Andy poderá estar inocente da acusação de homicídio, e que todos aqueles que
bem o conhecem, poderão, afinal, estar certos: Andy Wilson não é nenhum
assassino!
Culpado
ou inocente? O final é surpreendente e não responde a esta questão. Infelizmente
a passagem por Água Fria, a ultima povoação antes de Springville vai revelar-se
trágica para o pobre fugitivo, alterando, completamente, o rumo espectável dos
acontecimentos.
Publicada em Itália no início de 1976, na coleção mensal de Tex, Caccia all`uomo, “Caçada humana” no Brasil, marca uma nova fase do herói com a entrada em cena de um novo argumentista da série, Sergio Bonelli, que interrompe um ciclo de quase três décadas em que as aventuras eram, exclusivamente, da autoria de Giovanni Luigi Bonelli, seu pai.
Publicada em Itália no início de 1976, na coleção mensal de Tex, Caccia all`uomo, “Caçada humana” no Brasil, marca uma nova fase do herói com a entrada em cena de um novo argumentista da série, Sergio Bonelli, que interrompe um ciclo de quase três décadas em que as aventuras eram, exclusivamente, da autoria de Giovanni Luigi Bonelli, seu pai.
Após
uma queda ao praticar esqui aos 68 anos de idade, Giovanni, o criador de Tex,
vê-se obrigado a aceitar a sugestão de reduzir o volume de trabalho, de
escrever 110 páginas, para a edição mensal do personagem. Sergio Bonelli, que
assinava as suas históricas com o pseudónimo Guido Nolitta, para não ser
identificado com o progenitor, foi o voluntário, e “Caçada humana” a primeira
das 19 aventuras de Tex que Nolitta iria escrever até janeiro de 1999.
Na
época a principal função de Sergio na editora era tratar de assuntos
relacionados com a tipografia, distribuição, administração, correção de
rascunhos, e escrever cerca de duzentas páginas por mês para Zagor e Mister No.
Na verdade, como o próprio confidenciou, nos argumentos que escrevia de Águia
da Noite contava com a preciosa ajuda do seu pai que os relia, alterava
diálogos, e o aconselhava em determinadas cenas tentando, desta forma, não
descaracterizar o personagem e as suas aventuras.
Apesar
de “Caçada humana”, tal como as histórias seguintes escritas por Nolitta terem
a assinatura de G. L. Bonelli, (somente nas reedições mais recentes os créditos
foram atribuídos a Sergio), e apesar das revisões efetuadas pelo criador de Tex,
e dos esforços de Nolitta em “esconder” o seu estilo narrativo, a muitos dos
leitores, os mais ligados ao personagem, não passaram despercebidas as
diferenças que, se olharmos com atenção, são demasiado evidentes.
Um
herói mais bem-humorado, irónico, que trata o jovem foragido por “Cara de Anjo”
em tom sarcástico, mas também mais introspetivo: Na emboscada que sofreu ao perseguir
Andy após a fuga de Happy Fork[1]
e quando está a lutar pela vida nas águas turbulentas[2]
do riacho para onde foi atirado pelo jovem, na tentativa de recuperar,
novamente, a liberdade, podemos “ouvir” os seus pensamentos, deduções e dúvidas.
Mas não só, o Tex Nolittiano é também mais falível, comete diversos erros, como
na dedução do autor da emboscada já referida, na forma como se deixou
surpreender por Andy após a captura, ou como foi ludibriado pelo juiz em que é
ferido no ombro. Um herói que vai a reboque dos acontecimentos sem conseguir o
controlo dos mesmos, transparecendo a ideia que chega sempre atrasado e que se
revela impotente para alterar o rumo. Como exemplo, não obstante todos os seus
esforços não consegue cumprir a promessa a Andy de ter um julgamento justo nem
impedir o seu trágico fim.
Também
em termos narrativos existem diferenças notórias! Nolitta utiliza uma narração
“silenciosa”, deixando, intencional e estrategicamente, vinhetas sem diálogos,
isoladamente em pranchas ou em séries, ou mesmo pranchas completas e seguidas.
Por vezes utilizando apenas, pontualmente, cartuchos descrevendo a situação ou
o cenário. Esta técnica[3],
consoante a situação, confere maior dinamismo às cenas ou contribui para
aumentar a tensão e suspense. Outro recurso utilizado para o aumento a tensão e
suspense utilizado pelo autor, e bem patente nesta narrativa, consiste em
esconder os factos do leitor, só os revelando no momento em que o protagonista
toma conhecimento dos mesmos. A forma como revela o autor do atentado que Tex
sofre na perseguição a Andy, após fuga de Happy Fork[4],
e o fatídico final[5] do jovem foragido são
exemplos demonstrativos da utilização desta técnica.
O
cinema como fonte de inspiração na elaboração das tramas era outro dos recursos
regularmente utilizado por Sergio, e “El Muerto”, a segunda história escrita
pelo autor é uma boa amostra. Repleta de ingredientes característicos dos
denominados “Spaghetti western”, como vingança, violência, cidade fantasma,
duelo final, entre outros, “El Muerto” é uma narrativa de ódio e vingança em
que um misterioso pistoleiro, com o rosto deformado por queimaduras, lidera um
bando de criminosos nas brutais agressões, primeiro a Jack Tigre e mais tarde a
Kit Willer, ferindo este num ombro, com o único objetivo de obrigar Tex a um
duelo em Pueblo Feliz.
Aventura
em que apresenta, mais uma vez, um protagonista que não domina as situações,
que se revela incapaz de deter os vilões no primeiro encontro, que é forçado a
seguir para Pueblo Feliz como determinado pelo chefe do bando. Um herói, por
conseguinte, mais vulnerável, mais falível, mais melancólico e pensativo nas
suas deduções, do que o idealizado por G.L.Bonelli. Factos observados na forma
como Tex é completamente surpreendido[6]
quando se dirige para Pueblo Feliz e como erra ao considerar que El Muerto o principal responsável pelo ataque.
Em
termos narrativos Nolitta mantêm-se fiel à sua fórmula de contar histórias
utilizando vinhetas, propositadamente, sem diálogos para aumentar a tensão e
suspense mantendo, intencionalmente, o leitor na ignorância dos acontecimentos
até ao último momento. Sempre com esse objetivo de criar suspense e aumentar a tensão,
a identidade e as razões do ódio de El Muerto por Tex só são reveladas, pelo
próprio, num longo flashback, quando
se encontram cara a cara, no cemitério, imediatamente antes do duelo. Assim
como a agressão a Kit Willer que é contada, também ela, em flashback e pelo interveniente.
Não
obstante os receios de Sergio em substituir o pai, autor consagrado nos fumetti
italianos, o elevado volume de trabalho nos bastidores da editora, que
constituía a sua principal função na época juntamente com a construção dos
argumentos mensais para as aventuras de Zagor e Mister No, os seus verdadeiros
“filhos”, a verdade é que Nolitta não desiludiu. Muito pelo contrário! Escreveu
logo nos seus primeiros dois trabalhos de Águia da Noite, duas histórias, que
passados mais de quarenta anos continuam a ser incluídas na maioria das
seleções das melhores histórias do personagem. Mas não foram só estas duas
obras-primas que o ano de 1976 trouxe a luz, nesse ano, Sergio também escreveu
duas excelentes aventuras de Zagor, que também elas figuram na maioria das
seleções das melhores histórias do personagem: “Kandrax o mago” e “Dharma a
bruxa”.
Ambientada nos territórios de língua francesa do Canadá, esta narrativa tem como pano de fundo a rebelião dos habitantes de origem francófona contra o exército britânico. Tex e o capitão Jim Brandon após permitirem a fuga dos primos, Pierre e Roger Goudret, e recuperarem dos ferimentos sofridos, disfarçados de caçadores, iniciam a perseguição entrando nos territórios controlados pelos rebeldes na tentativa de os capturar e evitar a rebelião que poderia causar milhares de vitimas inocentes. Narrativa longa de 381 páginas, dramática, cheia de tensão, intercalada com momentos de humor tão ao gosto do criador, como o encontro de Tex com Jim no saloon de Great Falls[7], ou o encontro destes com Soublette[8], um dos guias da região. Mas é também uma aventura cheia de ação em que os protagonistas enfrentam inúmeras dificuldades, são feridos, aprisionados, torturados e impotentes para capturarem os responsáveis pela rebelião.
Chamemos-lhes
imprevisto, golpe do destino ou fator sorte, mas na realidade, as verdadeiras
razões do sucesso dos protagonistas nesta aventura devem-se, sobretudo, às divergências
de opinião dos primos Goudret sobre o rumo que a rebelião deveria tomar, à
instabilidade psicológica de Pierre, vulgo Big Bear, que assassina o seu primo,
que devido aos seus ideais e à sua capacidade de influenciar as tribos
indígenas era o grande responsável pela união das diversas raças em torno da causa,
e à ação de Donovan, o sargento que traiu a Policia Montada para se juntar aos
rebeldes, que impede Big Bear de matar Tex e Jim sacrificando a própria vida. Mais
do que qualquer ato corajoso ou heroico por parte deles!
Em
“O sinal de Cruzado” um grupo de jovens guerreiros Navajos abandona a aldeia de
Águia da Noite e segue Cruzado, e o seu bando de Paiutes, nos roubos e
assassinatos aos colonos da região. Tex e Tigre partem na perseguição do bando para
libertarem os Navajos da influência de Cruzado e convence-los a regressar a
casa. Aventura carregada de dramatismo que se conclui sem se perceber se os
heróis saíram vitoriosos. Após a captura de Cruzado, o final expectável,
Nolitta prolonga a história em cerca de setenta pranchas ao incluir o trágico
regresso a casa, em que cinco dos seis Navajos sobreviventes vão perder a vida.
Ao falhar na missão de trazer os jovens guerreiros de volta à aldeia, a vitória
sobre Cruzado perde significado, transformando-se em algo muito semelhante a
uma derrota. A destacar a inclusão nesta trama, ainda que de uma forma
disfarçada e superficial, um tema ainda hoje fraturante na sociedade
contemporânea - a eutanásia - quando um guerreiro Navajo, após ter sido
torturado e deixado para morrer[10],
suplica a Tex que ponha termino à sua vida. A abordagem ao tema pode considerar-se
leve porque impede o herói de tomar uma decisão, visto que, enquanto este
hesita, o jovem acaba por falecer. No entanto, esta é mais uma das situações em
que o autor se distingue do seu pai, e da sua forma de contar as histórias, que
nunca colocaria o protagonista das suas aventuras numa situação tão polémica.
As aventuras seguintes poderão não ser tão dramáticas, mas são igualmente interessantes e carregadas de suspense e mistério em torno dos responsáveis pelos eventos, sendo, por vezes, enriquecidas com a inclusão de referências históricas, como personalidades, atos ou eventos. Em “O solitário do Oeste” Tex e Kit integram uma expedição militar e cientifica americana, ao istmo do Panamá, com o objetivo de verificar a viabilidade da construção de um canal para ligar os oceanos Atlântico e Indico. Timothy O` Sullivan, o fotógrafo que os acompanha, é a personalidade histórica que Nolitta introduziu na trama, e a expedição científica o facto. Nesta narrativa a expedição é alvo de frequentes incidentes e de diversos ataques índios que a atrasam e dizimam os seus membros. Quem está por trás? Porquê? Os protagonistas e o leitor têm a mesma perceção dos factos desconhecendo a identidade dos responsáveis que só é revelada nas últimas páginas da obra. Todavia o autor não explica tudo! As motivações do traidor não são reveladas. nem necessitava de o fazer! Com maestria Nolitta cria um desfecho plausível que dispensa que o leitor conheça as razões da traição. O não explicar tudo, o deixar pontas soltas adensando o mistério, é outro recurso frequentemente utilizado pelo autor para tornar as narrativas mais realistas e interessantes. Afinal nem tudo na vida têm explicação.
As aventuras seguintes poderão não ser tão dramáticas, mas são igualmente interessantes e carregadas de suspense e mistério em torno dos responsáveis pelos eventos, sendo, por vezes, enriquecidas com a inclusão de referências históricas, como personalidades, atos ou eventos. Em “O solitário do Oeste” Tex e Kit integram uma expedição militar e cientifica americana, ao istmo do Panamá, com o objetivo de verificar a viabilidade da construção de um canal para ligar os oceanos Atlântico e Indico. Timothy O` Sullivan, o fotógrafo que os acompanha, é a personalidade histórica que Nolitta introduziu na trama, e a expedição científica o facto. Nesta narrativa a expedição é alvo de frequentes incidentes e de diversos ataques índios que a atrasam e dizimam os seus membros. Quem está por trás? Porquê? Os protagonistas e o leitor têm a mesma perceção dos factos desconhecendo a identidade dos responsáveis que só é revelada nas últimas páginas da obra. Todavia o autor não explica tudo! As motivações do traidor não são reveladas. nem necessitava de o fazer! Com maestria Nolitta cria um desfecho plausível que dispensa que o leitor conheça as razões da traição. O não explicar tudo, o deixar pontas soltas adensando o mistério, é outro recurso frequentemente utilizado pelo autor para tornar as narrativas mais realistas e interessantes. Afinal nem tudo na vida têm explicação.
O
suspense criado em torno dos responsáveis pelos eventos é utilizado,
magistralmente, nesta aventura assim como em “O vale da morte”, “A grande
ameaça” ou “O assassino sem rosto”, em que o autor cria enredos extremamente cativantes.
O primeiro sobre a escravização dos índios Shoshones na extração de bórax em
pleno deserto Mojave, o segundo sobre os assassinatos das famílias da
comunidade Mórmon de Cedar City, por um grupo de misteriosos mascarados, e o
terceiro sobre sabotagens ao tratado de paz entre o governo americano e os
índios Cheynnes
Em
“A grande ameaça” o mistério não fica limitado aos autores dos massacres. O
duplo M e as palavras “Montain Meadow” deixados nos locais dos assassinatos,
pelo misterioso bando, têm um significado que os líderes da comunidade Mórmom
bem conhecem e que procuram a todo custo esconder. Será que existem inocentes
nesta história? Quem são? Quanto ao responsável pelos atentados, o líder dos
encapuzados, a sua identidade é tão camuflada que, quando revelada, surpreende
até o próprio Tex.
Em
“O assassino sem rosto” Nolitta parece ter esquecido o Tex heroico, clássico, e
bonelliano, que deveria seguir, ou no mínimo, o que se pode dizer, é que este
argumento não foi revisto pelo seu pai, pelo que constitui um excelente exemplo
da narrativa e do herói Nolittiano. Tex é surpreendido por um tiro que impede a
assinatura do tratado de paz entre o governo americano e os Cheyennes, é ferido
com gravidade na cabeça por Appanoosa, o chefe dos Cheyennes, sendo incapaz de
o convencer que não têm responsabilidades no sucedido, é impotente para impedir
a morte de Formiga Preta, o filho de Appanoosa, têm de fugir para salvar a
própria vida e é apelidado de “verdadeiro inimigo” e “cão traidor” pelo chefe
dos Cheyennes. Nolitta apresenta-nos um herói abatido, derrotado, conformado com
o fracasso, cuja única pista que possui da identidade do sabotador e assassino
é um medalhão de mulher encontrado na mão do assassinado, Formiga Preta, mas
que se revela inútil, já que se trata de uma faceta desconhecida. Somente o
fortuito encontro com Timothy O´ Sullivan e o facto de este ser fotógrafo vai
permitir desvendar a identidade do sabotador e assassino.
“Cheynne
Club”, aventura publicada em Itália nas edições mensais de Tex números 289 a
292, entre novembro de 1984 e fevereiro de 1985, marcou o fim de ciclo iniciado
com “Caçada humana”, nove anos antes. Provavelmente, nem o próprio Sergio
imaginaria que o apoio prestado a seu pai, na difícil tarefa de escrever as
aventuras de Tex, iria ser tão duradouro. Sergio escrevia os enredos do ranger
em situações verdadeiramente difíceis, nos seus tempos livres, de noite, em
viagem e nos intervalos das suas verdadeiras tarefas na editora, que lhe
roubavam muito do seu tempo: as questões comerciais e editoriais, assim como a
criação dos argumentos para Zagor e Mister No. Apesar disso sentia uma grande
responsabilidade ao escrever as tramas de Tex, por ser um personagem criado
pelo seu pai, e por ter mudado a sua vida pessoal e profissional. Por esses
motivos escrevia com muita seriedade e preocupação, porque tinha conhecimento
que as suas histórias, e o “seu” Tex, seriam muito diferentes senão estivesse
“amarrado” a imitar o Tex de seu pai. O afastamento de Sergio foi possibilitado
pela entrada de Claudio Nizzi, que demonstrou, em poucas histórias, ser capaz
de substitui-lo, revelando-se um profundo conhecedor do personagem e das suas
aventuras, e mais importante: ser capaz de reproduzir o estilo de Bonelli pai! Algo
que Sergio, por muito que tentasse, não o conseguia. Como evidenciam as
histórias que escreveu ao longo deste ciclo.
O
herói idealizado por Nolitta é um personagem moderno, menos ousado e arrogante,
dependente de outros, da sorte ou destino, que duvida das suas capacidades, que
erra nas suas avaliações e deduções, que é surpreendido frequentemente pelos
seus inimigos, que por vezes falha nos seus compromissos e objetivos, e que por
vezes é derrotado e sofre perdas - circunstancias em que se revela incapaz de
proteger os seus amigos ou os que estão à sua guarda. Mas é também um
protagonista mais realista e calculista nos momentos de perigo, que pondera os
riscos e é capaz de fazer pactos com os inimigos. O Tex Nolittiano é ainda mais
bem-humorado, sarcástico com os inimigos e adversários e brincalhão com os
parceiros, mais introspetivo nas suas deduções, capaz de demonstrar sentimentos
como raiva, frustração ou indignação. Em suma, o Tex de Nolitta é uma mistura
do herói criado pelo seu pai com Zagor e Mister No, seus personagens, pois
incorpora, claramente, características das personalidades destes dois heróis.
Quanto
às histórias idealizadas por Nolitta são muito mais de que western puro! A sua
habilidade para a mistura dos diversos géneros literários na mesma narrativa e
a sua atração pela comicidade, elemento indispensável nas suas tramas, assim
como suspense, torna-as difíceis de classificar. São por norma mais complexas, imprevisíveis,
repletas de volte-faces, com maior dimensão psicológica e dramatismo, repletas
de mistério e tensão em que o autor inclui pequenos episódios quotidianos para
alternar ou quebrar os ritmos narrativos. O herói apresenta-se normalmente
sozinho ou acompanhado por apenas um dos seus parceiros, as personagens
secundárias têm personalidade, dificilmente classificadas como bons ou maus, os
desfechos, devido ao seu estilo narrativo de esconder os factos do leitor, são
interessantes e por vezes surpreendentes.
Criada
numa situação de emergência face à necessidade que o seu pai teve em reduzir o
volume de trabalho, devido à avançada idade e ao acidente a praticar esqui, inspirada
em factos verídicos, cinema ou simples fotografias[13],
a versão Nolittiana, a alternativa, cuja existência se pressupunha curta,
acabou por prolongar-se por 9 anos e incluir 16 histórias, tornando-se
marcante, distinta, intemporal e memorável, ao ponto de hoje, passados mais de
três décadas, continuar a ser recordada e as suas aventuras continuarem a ser
incluídas nas seleções das melhores histórias por grande parte dos fans do
herói, sendo, em minha opinião, a melhor versão do personagem desde a sua
criação no longínquo ano de 1948.
Nota Final:
Para
escrever este texto reli todas as 19 aventuras escritas por Nolitta, e li com
muito prazer. Mesmo histórias que na época não dei grande valor como, “O cowboy
sem nome”, “Sasquatch”, “Os mercadores da morte” ou “Cheynne Club”. A leitura
só confirmou o que pensava: as aventuras desta fase são muito melhores do que
as histórias atuais!
Não
é de agora! Já havia confessado anteriormente a minha preferência pelas
histórias de Tex escritas por Gian Luiggi Bonelli e Guido Nolitta e alguma
desilusão com as histórias atuais do personagem. Preferências denunciadas em
textos como “O elo[14]”
e “Trapper[15]”. O facto de a grande
maioria das histórias atuais serem produzidas em blocos múltiplos de 110
páginas, associado ao grande volume de histórias que cada argumentista escreve
em simultâneo, pode, em minha opinião, justificar o porquê das aventuras atuais
serem tão previsíveis e por vezes desinteressantes. Os escritores estão
demasiado amarrados a estes limites que lhes restringe a criatividade. Recordo
que na referida “idade de ouro” as aventuras iniciavam-se e terminavam em
qualquer ponto da revista, sem número definido de páginas. Curiosamente, ou
talvez não, o término dessa fase é quase coincidente com a opção editorial de
fechar as aventuras nos referidos blocos de páginas.
Principais referências:
Em nome do pai – Moreno Burattini – Revista Clube Tex Nº
7
Um Tex meio Zagoriano – Júlio Schneider – Tex Ed.
Histórica Nº 92
Listas de Histórias, (série
mensal), escritas por Guido Nolitta e sua correspondência no Brasil:
Caçada
humana - TEX 68-69 – T2E 68-69 – TXC 235-237 – TEH 92.
El
Muerto – TEX 112 – T2E 112 – TXC 242-243 – TEH 96 – ATX 07.
O cowboy sem nome – TXC 254-255 – TEH
101 – ATX 10.
Missão em Great Falls – TEX 131-134 –
T2E 131-134 – TXC 255-259 – TEH 102.
Sasquatch – TXC 272-275 – ATX 32.
Missão suicida – TXC 275-278 – TXO 10.
Mercadores de morte – TXC 288-291 – TEX
MS – 02.
O sinal de Cruzado – TEX 157-159 – TXC
294-297.
O solitário do Oeste – TEX 163-165 –
TXC 303-305.
Aventura no Caribe – TXC 306-307 – TAV
01.
O vale da morte – TEX 160 – TXC
307-309.
A flecha quebrada – TEX 167-168 – TXC
314-315.
A patrulha perdida – TEX 177-179 – TXC
324-326 – TEF 10.
A grande ameaça – TEX 181-183 – TXC
329-330.
O assassino sem rosto – TEX 193-195 –
TXC 340-342 – TEF 08.
Cheyenne Club – 195-198 – TXC 342-345 –
TXO 01.
Retorno a Pilares – TEX 297-299 e 301 a
304 – TXC 440-445 – TXO 41-42.
● LA STRAGE DI RED HILL - 431-435 (Set 1996-Jan 1997) - Desenhos de Alberto
Giolitti e Giovanni Ticci.
O massacre de Red Hill – TEX 343-348 – TXO 56-57.
Golden Pass – TEX 382-385 – TXO 73.
LEGENDA:
·
TEH - Tex Edição
Histórica
·
T2E - Tex 2.ª Edição
·
TXC – Tex Coleção
·
TXO - Tex Ouro)
·
ATX - Almanaque
Tex
·
TEF – Tex Especial Férias
·
TAV –
Tex e os Aventureiros
[1] TEX ED.
HISTÓRICA Nº 92 – Caçada humana, páginas 76 a 81.
[2] TEX ED.
HISTÓRICA Nº 92 – Caçada humana, páginas 167 a 170.
[3] TEX ED.
HISTÓRICA Nº 92 – Caçada humana, páginas 174, 190, 204 e 221 – Exemplos de
narração silenciosa.
[4] TEX ED.
HISTÓRICA Nº 92 – Caçada humana, página 80.
[5] TEX ED.
HISTÓRICA Nº 92 – Caçada humana, páginas 224 e 225.
[6] TEX ED,
HISTÓRICA Nº 96 – El Muerto, páginas 102 a 119.
[7]
TEX COLEÇÃO Nº 255 – O caubói sem nome, páginas 87 a 110. A chegada de Jim e
Donovam a Great Falls, toda a cena no saloon, a atuação do mágico, os diálogos
de provocação constituem um pequeno episódio humorístico típico das histórias
Nolittianas que pouco acrescentam à trama principal.
[8]
TEX COLEÇÃO Nº 257 – Um País em chamas, páginas 27 à 49. Após a decisão de irem
para o forte Brooks, os diálogos entre Tex e Jim e a situação de não poderem
acender a fogueira até ao encontro com Soublette estão repletos de humor.
[9]
TEX COLEÇÃO Nº 257 – Um País em chamas, páginas 05 aà 22. Tex coloca Jim inconsciente e foge a cavalo
abandonando a patrulha que é chacinada. Não por cobardia mas por considerar que
o sacrifício seria inútil.
[10] TEX
COLEÇÃO Nº 296 – O caçador e a presa, páginas 34 e 35.
[11] Na fase
de ouro do personagem (meados década de sessenta a meados da década de
oitenta).
[12]
Exclui-se os diálogos provocadores entre Tex e seus “pards”, especialmente com
Carson.
[13] Os
traços gerais de “Il killer senza volto” – “O assassino sem rosto” no Brasil –
foram inspirados numa foto tirada em maio de 1968 que retrata o encontro de
membros do governo com chefes de diversas tribos índias, no forte Laramie,
Wyoming para a assinatura de um tratado de paz.
[14] Revista
Clube Tex Portugal Nº 1 - “Confesso alguma desilusão com as histórias atuais de
Tex. Não prendendo colocar em causa a qualidade dos argumentistas, que
considero excelentes, mas nas histórias de Tex falta algo! Muitas das histórias
até começam bem, mas depois o ritmo narrativo é lento, existem poucas cenas de
ação, não existem inimigos perigosos e carismáticos, não existe suspense e,
terminam normalmente de forma abrupta e previsível. …O Tex atual está muito
diferente do Tex da fase de Ouro. As histórias são demasiado complexas, por
vezes monótonas, existe muito pouca ação para um Western. O doseamento entre os
diversos ingredientes, de uma história texiana, não está correto.”
PS: Texto publicado na revista Clube Tex Portugal Nº 10 em Julho de 2019
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