TEX 1ª EDIÇÃO Nº 71 |
TEX 2ª EDIÇÃO Nº 112 |
Nesta época, a maioria das
histórias publicadas pela Vecchi, a editora que detinha os direitos do
personagem para o Brasil e Portugal, eram retiradas da fase que considero “a
idade de ouro” deste herói: meados da década de sessenta e início dos
anos oitenta! Tive assim acesso, logo nos primeiros anos, a algumas das
histórias que hoje são consideradas como grandes clássicos e geralmente aceites
como das melhores histórias de todos os tempos: "Forte Defiance", "A
cruz trágica", "Entre duas
bandeiras", "A noite dos
assassinos", "Terra
prometida", "A grande
intriga" ou "El Muerto".
A imaginação dos Bonelli, Giovanni Luigi e Sergio, era tão frutuosa, que a
qualidade dos argumentos era na sua grande maioria elevada, não sendo de
estranhar que muitas outras aventuras tenham marcado esta época e ficado
na memória dos aficionados deste personagem. Além das referidas, entre as mais
consensuais salientam-se ainda: “Caçada
humana”, “Missão em Great Falls”,
“O vale da morte”, “O solitário do oeste”, “A patrulha perdida”, “A grande ameaça” ou “O assassino sem rosto”. Outras passaram
um pouco despercebidas pelos fãs, talvez pela proximidade de publicação e não
porque fossem de qualidade inferior. Entre essas aventuras encontra-se uma que aprecio
particularmente e que, em minha opinião, merece destaque: “Trapper!"2
1ª TIRA DE "TRAPPER!" |
Em Saint Louis, Tex e os seus pards salvam de um atentado
Tom Hogan, dono da companhia de peles Missouri. Decididos a ajudar Hogan, o
grupo vai envolver-se numa verdadeira guerra pelo negócio das peles. Jackson,
proprietário da Rocky Montains,
companhia que Hogan abandonou para fundar a Missouri,
juntamente com dez dos seus melhores caçadores, utiliza todos os meios ao seu
alcance para absorver a nova companhia e, assim, poder competir com as grandes
companhias de peles, como a Hudson Bay. Com
as informações obtidas no interrogatório a Bert Morley, um dos elementos
envolvidos no planeamento do atentado a Jackson, os cinco parceiros começam a
desenvolver ações para o desmantelamento da criminosa organização. Infelizmente,
nem tudo vai correr de acordo com o planeado e, ao prestarem auxilio a uma
caravana da Missouri, que estava a
ser atacada pelos índios Snake, Tex e Tigre são capturados. A
destruição dos planos de Jackson deixa de ser uma prioridade para Kit Carson,
Kit Willer e Pat, o irlandês. Há que elaborar um plano de resgate que
permita libertar rapidamente os seus amigos. Entretanto, na aldeia dos índios Snake,
Pequeno Trovão, o chefe da tribo, é persuadido por Wanaima, a índia que Tex
havia deixado em liberdade após assassinar o marido, a tratar os prisioneiros
como guerreiros. Esta providencial intervenção vai possibilitar a
Tex e Tigre uma ténue tentativa de sobrevivência! Em vez de
morrerem torturados num poste, vão ser caçados por todos os guerreiros
que queiram participar, num ritual índio, em que a
vida ou morte dos condenados, apenas depende da ligeireza das suas pernas:
A corrida da flecha!
CAÇADOR DE PELES NO SÉC. XIX |
“Trapper!” possui um argumento bastante simples: guerra
entre duas companhias de peles pelas melhores rotas, em que uma, a Missouri, tenta sobreviver aos ataques
desleais que a segunda, a Rocky Montains,
utiliza para conseguir arruiná-la e adquiri-la, conseguindo assim dimensão para
competir com as outras grandes companhias de peles. Partindo desta base, G.L.
Bonelli, o autor deste enredo, consegue desenvolver uma história bem
interessante, consistente e bem construída, sem recurso a flashbacks, ou a saltos temporais. Aliás, em momento algum desta
aventura existe referência à época! Não existem histórias secundárias a
competirem com a trama principal, mas sim pequenos episódios em sequência, que
estão interligados, e só por si poderiam resultar em histórias completas.
Principalmente o episódio em que, ao socorrerem a caravana da Missouri, Tex e Tigre são capturados
pelos índios Snake, ou o seguinte, a destruição por Tex e os seus pards do
bando de Shady Bill e a tomada da caravana da Rocky Montains. Relativamente ao ritmo narrativo, existe um bom
doseamento das cenas de ação, mantendo a narrativa rápida em grande parte da
história, (ritmo adequado para um western), em que alterna entre o rápido nas
diversas cenas de ação, com o mais lento nas cenas mais descritivas,
preenchidas com diálogos longos e extensos, ou com a utilização de cartuchos e
legendas para efetuar pontos de situação ou para explicação de determinadas
expressões, como: “contar golpes”, “rendez-vous” ou “free for all”.
PAT EM SITUAÇAO EMBARAÇOSA COLOCADO PELO SEU CAVALO |
PEQUENO TROVÃO, O CHEFE DOS SNAKE |
Outro aspeto menos conseguido é a
conclusão da aventura! Após
a rendição da caravana da Rocky liderada por Ben Dermott, completamente iludido
com a estratégia de Tex, este delega em Pat a missão de informar Hogan dos
últimos eventos e instrui-lo para não perder a oportunidade de enfrentar
Jackson, agora que a organização se encontra totalmente destruída. Este final,
abrupto e apressado, sem definir o destino de Jackson4, é talvez a parte mais pobre da obra!
PRANCHA DE TEX 56 - APACHE KID |
VINHETA "RASGADA" |
AMBIENTE NOTURNO |
AVENTURA DA IDADE DE OURO "A NOITE DOS ASSASSINOS" |
Se retirarmos a Trapper! o desfecho que, como já referi, considero bastante fraco,
tendo em conta a dimensão do enredo, todos os outros ingredientes estão bem
presentes, com um doseamento adequado e, se adicionarmos o trabalho gráfico de
Nicolò, competente, bastante
personalizado, conseguindo bons desempenhos em todos os ambientes e cenários,
mesmo considerando não tendo a profundidade de Villa, o dinamismo de Ticci, que
também faz parte dessa fase, o realismo de Frisenda, o detalhe de Rossi, ou
mesmo a perfeição de Civitelli, perceberemos que estamos perante um verdadeiro
western, digno de figurar na galeria das obras primas bonellianas.
LEGENDA:
1 História publicada originalmente em Setembro e Outubro de 1975 em
Itália, nos números 179 e 180 da coleção Tex. No Brasil já foi
publicada quatro vezes, a primeira no Nº 71 da coleção Tex, em Janeiro de 1971.
2 Na Itália saiu para as bancas pela
primeira vez entre Novembro de 1976 e Fevereiro de 1977, nos números 193 a 196
da edição regular de Tex. No Brasil foi publicada inicialmente entre Fevereiro
e Maio de 1981, também na edição mensal, nos números 120 a 123.
3 Bisontes, bisões ou búfalos.
4 O facto de o destino de Jackson não ter sido revelado deixou em aberto o seu regresso numa próxima aventura! Retorno esse que passados quase quarenta anos ainda não foi aproveitado por nenhum dos argumentistas do personagem. Boselli, que têm “ressuscitado” diversos personagens da saga, têm em Jackson um inimigo poderoso e sedento de vingança, capaz de protagonizar uma excelente trama, na linha de “A grande intriga”: um homem poderoso a movimentar influências para prejudicar Tex e os seus amigos, levando-os a enfrentar enormes dificuldades, permanecendo no anonimato até próximo do final da aventura. Momento em que seria então revelado em flashback, o sucedido após Tex se ter despedido de Pat.
5 Sou de opinião
que a qualidade média das histórias aumentou nos últimos anos, se comparada com
as últimas duas ou três décadas. Refiro-me por exemplo, só para mencionar
algumas das histórias mais recentes: “Na
pista de El Supremo”, “Jovens
assassinos” ou “Patagónia”. Esta
ultima, unanimemente considerada como das melhores histórias do personagem! Suponho
que este ganho de qualidade se deva, essencialmente, à entrada de Gianfranco
Manfredi, Tito Faraci e Pasqualle Ruju para o staff, que além de trazerem novas
ideias e novas perspetivas para o personagem, permitiram reduzir a quantidade
de argumentos destinados a Boselli, dando-lhe assim mais tempo para o
desenvolvimento dos seus roteiros.
FONTES:
TRAPPER! – TEX 1ª EDIÇÃO Nº 120 A 124
PS: Texto publicado na revista Clube Tex Portugal Nº 3 em Dezembro de 2015
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